Invasão da UFSC não tem nada a ver com maconha
26 03 2014
Quando tomei conhecimento da
invasão da Universidade Federal de Santa Catarina, ontem, 25 de março,
por policiais federais não identificados, já imaginei o teor das
notícias da mídia no dia seguinte tentando dividir os atores em os que
são a favor da maconha e os contra. Afinal, uma das formas mais comuns
de manipular informações é desviar o foco do principal para uma falsa
polêmica e esta mídia é a mesma que apoiou o golpe militar em 64. Vamos
reler os fatos.
Em primeiro lugar os
policiais que iniciaram a ação, não se identificaram como tal, tampouco
tinham ordem judicial para prender gente. Sem se identificar, não estão
efetuando uma prisão, estão realizando sequestro exatamente como os que
são lembrados às vésperas do aniversário de 50 anos da ditadura militar.
Nem o carro em que chegaram era identificado. São práticas típicas da
polícia política da ditadura. Como saber se o estudante estava sendo
preso ou sequestrado? Quem sabe até por narcotraficantes? Além do mais
qualquer operação policial dentro de uma Universidade Federal deve ser
comunicada à Reitoria antes e negociada de comum acordo. Ninguém pode
invadir uma Universidade e sequestrar estudantes. Isto acontecia,
repito, na ditadura quando tínhamos um Estado sem leis e os direitos
individuais estavam suspensos.
E também vamos parar com o
moralismo de tratar maconha como se fosse pior que drogas legais, tipo
cigarro, que mata e ninguém se importa. É que o tabaco enche os cofres
de multinacionais que o exploram diretamente e da indústria de
medicamentos e equipamentos médicos usados para tratar da epidemia de
câncer provocada por esta droga.
Polícia que não se
identifica está agindo como bandido, fora da lei, e foi tratada como
bandido pelos estudantes até descobrirem do que se tratava. Ouvi o tal
delegado no rádio dizendo-se ofendido pela nota da Reitoria que repudia a
invasão, chamando a reitora de irresponsável e acusando-a de querer
transformar a UFSC numa “república de maconheiros”. Disse quase a mesma
coisa no Jornal Nacional (Está ficando famoso). Exatamente o mesmo
discurso da imprensa comercial. Aqui vale uma observação. O Delegado
Cassiano é muito jovem, deve ter passado nesses últimos concursos que
são disputados por uma nova categoria chamada de concurseiros. Nada
posso afirmar do delegado pois não o conheço. Mas conheço muitos
outros. Estas pessoas são na maioria jovens que, tão logo recebem o
diploma, se ocupam unicamente de estudar e viajar pelo Brasil fazendo
concursos, em geral, às expensas da família já que, para tanta
atividade, não é possível trabalhar. Um dia são aprovados e passam a ser
um juiz, um procurador, um delegado, investidos de autoridade de Estado
sem que tenham experimentado a vida real. Muitos desses conhecem o
mundo pelas páginas da Veja, assinada pelos pais. Espera-se que o
Ministro da Justiça e o Ministério Público Federal abram inquérito e
processem este delegado por desacato e total despreparo emocional para o
exercício da função. A Polícia Federal há muito tempo é um órgão sério
empenhado como poucos no combate à corrupção e aos crimes de colarinho
branco e não merece ser julgada por atos despropositados e
preconceituosos como este. Irresponsável ao extremo é o delegado que
mandou lançar gás lacrimogênio e outros artefatos do gênero contra
estudantes desarmados na hora da saída das crianças do Colégio Aplicação
e outras duas escolas infantis existentes no local onde se deu o triste
episódio. Li no jornal que o delegado está substituindo o
superintendente – presumivelmente em férias. Dá a impressão de que
aproveitou a ausência do titular e da momentânea investidura no Poder
para buscar seu minuto de fama armando uma operação espetacular. Para
que? Para capturar os donos do tráfico? Não. Para vasculhar Jurerê
Internacional onde foram presos magnatas do tráfico há pouco tempo pela
própria Polícia Federal? Não. Para pegar os traficantes que abastecem de
crack os morros de Florianópolis? Também não. A operação desastrosa
tinha por objetivo pegar “perigosos” estudantes de Ciências Humanas que
fumavam um baseado sem colocar em risco a vida de ninguém! Para isso o
delegado foi responsável pela invasão de um campus universitário, cheio
de jovens estudantes, por soldados armados da Polícia de Choque! Ainda
bem que os estudantes também estavam armados com suas câmeras. O vídeo
abaixo mostra o poder de fogo de uma lente afiada.
A Polícia Federal não tinha
nada mais importante para fazer? A sociedade brasileira espera muito
mais dessa instituição. Espera que prenda os óbvios donos da droga
apreendida no helicóptero dos Perrela. Espera uma operação para
desvendar os casos de corrupção ambiental que saltam aos olhos de
qualquer cidadão de Florianópolis. Espera que prenda o Presidente da
Assembléia Legislativa de SC, envolvido em crimes de colarinho branco.
Ocorre que criminosos grandes são sempre protegidos pela mídia e
tratados como vítimas quando investigados. Lembram do banqueiro Daniel
Dantas que preso por corrupção, com mandado judicial, tentou subornar o
Delegado Federal? Para a mídia o banqueiro foi vítima e o delegado
bandido. Talvez o estudante sequestrado, por portar alguns cigarros de
maconha, seja a chave para desbaratar uma quadrilha internacional de
tráfico de drogas! Uau! Não sejam ridículos. Todos sabem que um mero
usuário final compra a droga na esquina e jamais vai levar aos magnatas
do tráfico, simplesmente porque não tem a menor ideia de quem sejam.
Quem tem obrigação de saber é a polícia e para tanto deve fazer como faz
com a corrupção, planejando e executando por anos operações de
inteligência conjuntamente com o Ministério Público e a Justiça Federal,
tudo dentro da lei. A Polícia Federal sabe fazer isto muito bem. O
Delegado Cassiano, no entanto não tinha nenhum interesse em combater o
tráfico na raiz como deveria ser sua atribuição. Se tivesse esta
intenção, o último lugar provável para encontrar alguma conexão seria a
Universidade. Ele atuou com abuso de poder, que é crime, pois não tinha
mandado para invadir uma universidade federal. Atuou aparentemente para
atender interesse particular e não público (fama momentânea e espaço na
mídia, sabe-se lá com que outras intenções) o que pode configurar, se
apurado, crime de prevaricação. Efetuou prisão de forma clandestina pois
não se identificou como polícia, o que também é crime. Somente quando a
confusão foi formada os policiais se apresentaram como tal, de acordo
com todos os depoimentos de professores e estudantes que presenciaram o
fato.
O delegado, que talvez se
sentisse melhor trabalhando no DOI-CODI do regime golpista, realizou uma
“operação” pirotécnica ilegal em conluio com a Polícia de Choque que
evidentemente estava a par e a postos para o assalto e operações dessa
natureza não se realizam sem preparação logística prévia. O governador,
que comanda a polícia militar, está devendo explicações embora a
autointitulada “imprensa profissional” tenha esquecido de fazer esta
ligação, colocando como centro do problema não os atos abusivos do
delegado e da polícia, mas reduzindo-a a uma simples questão de ser a
favor ou contra a maconha. Uma das formas mais comuns de manipulação da
informação pela imprensa comercial é desviar o foco da atenção do
principal para um problema secundário de ordem moral sobre o qual as
pessoas já tem opinião formada. Dessa forma o debate fica resumido a uma
briga de torcidas de times de futebol na qual ninguém vai abrir mão do
seu time. Enquanto isso, o que deveria ser debatido, fica fora da pauta.
Por fim uma última
observação. Não deixa de ser curioso que o delegado tenha escolhido para
sua operação ilegal justamente o momento em que os saudosos da ditadura
se assanham, incentivados por Veja, Rede Globo e outros veículos de
comunicação que apoiaram o golpe militar. Assistimos há alguns dias até
mesmo a tentativa de realização de uma patética marcha, com cartazes
pedindo expressamente a volta da ditadura. A ação isolada deste delegado
despreparado deve ser veementemente repudiada por toda a sociedade
catarinense e principalmente pelos seus próprios colegas que tem
prestado, via de regra, excelentes serviços ao país.
Quando você, que está lendo
este texto, se posicionar sobre a invasão da UFSC, preocupe-se em dizer
se é a favor ou contra uma polícia que age fora da lei e dos limites
impostos ao Estado pela Constituição, para proteger os cidadãos. Esta é a
questão principal deste debate. Os cinco cigarros de maconha só estão
ai para desviar sua atenção. Não fique chapado com as interpretações da
“imprensa profissional”. Ela é muito mais poderosa que a maconha para
confundir sua percepção da realidade.
Inúmeras manifestações
contra a ditadura estão sendo organizadas em todo o país. Elas tem por
objetivo repudiar qualquer tentativa de assaltar o poder para atender
interesses particulares de pessoas ou grupos minoritários. As que vão
ocorrer em Florianópolis são a melhor oportunidade que temos para dizer
não ao autoritarismo e repudiarmos qualquer forma de ataque à
democracia, como o que ocorreu na UFSC. Muita gente prefere que fiquemos
discutindo a maconha em vez de lembrarmos nosso passado para evitar que
ele volte. Que nos encontremos todos na rua, dia primeiro de abril às
17 horas.
http://criticadaespecie.com/2014/03/26/invasao-da-ufsc-nao-tem-nada-a-ver-com-maconha/
Chris Seu comentário está aguardando moderação
Sim, é facilmente perceptível a manobra focando a discussão sobre a maconha.
É claro o seu ensinamento sobre o grau de relevância de alguns cigarros de maconha frente a crimes de maior vulto, embora não o tenha feito de forma absolutamente imparcial e pessoas que têm problemas de interpretação de texto se apeguem a este ínfimo ponto de seu texto, apesar dos outros 99% de lucidez e esclarecimento.
Aqui apenas alguns exemplos da hipocrisia, do quão tacanhas são as pessoas que bradam, clamam, rugem, conclamam o combate da ilegalidade de algo como o uso de maconha: baixam música pirata, assistem a vídeos piratas, compram produtos piratas e contrabandeados, não respeitam o limite de velocidade da vias, estacionam o carro em vagas para deficientes/idosos, estacionam em lugar proibido, sonegam impostos, trazem produtos de Miami para o país sem declará-los e por aí vai. Imaginem a cena da PF arrombando as portas e invadindo as suas casas, seus criminosos!
Parabéns, é bom saber que ainda há pessoas com lucidez como você e tenho apenas uma ressalva a fazer: Direita X Esquerda (Comunismo) acho que é mais um artifício para manipular a sociedade no contexto em que estamos, manipulação essa vinda exatamente das mesmas fontes que fomentam a final do clássico: favor X contra maconha. Outro embate que agita e emociona as arenas do país, já sabemos, é outro clássico Direita X Esquerda. Enquanto isso o país é dilapidado em seus recursos naturais, humanos, na cidadania, no futuro melhor para este povo.
É claro o seu ensinamento sobre o grau de relevância de alguns cigarros de maconha frente a crimes de maior vulto, embora não o tenha feito de forma absolutamente imparcial e pessoas que têm problemas de interpretação de texto se apeguem a este ínfimo ponto de seu texto, apesar dos outros 99% de lucidez e esclarecimento.
Aqui apenas alguns exemplos da hipocrisia, do quão tacanhas são as pessoas que bradam, clamam, rugem, conclamam o combate da ilegalidade de algo como o uso de maconha: baixam música pirata, assistem a vídeos piratas, compram produtos piratas e contrabandeados, não respeitam o limite de velocidade da vias, estacionam o carro em vagas para deficientes/idosos, estacionam em lugar proibido, sonegam impostos, trazem produtos de Miami para o país sem declará-los e por aí vai. Imaginem a cena da PF arrombando as portas e invadindo as suas casas, seus criminosos!
Parabéns, é bom saber que ainda há pessoas com lucidez como você e tenho apenas uma ressalva a fazer: Direita X Esquerda (Comunismo) acho que é mais um artifício para manipular a sociedade no contexto em que estamos, manipulação essa vinda exatamente das mesmas fontes que fomentam a final do clássico: favor X contra maconha. Outro embate que agita e emociona as arenas do país, já sabemos, é outro clássico Direita X Esquerda. Enquanto isso o país é dilapidado em seus recursos naturais, humanos, na cidadania, no futuro melhor para este povo.
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