Kroton Educacional: ‘Em termos de educação pública nunca
experimentamos um inimigo com uma força social tão concentrada como
esse’
A
Kroton Educacional,
maior empresa de educação do mundo, vai se tornar ainda maior. Na
última terça-feira (24) saiu o anúncio de que a companhia assumiu o
controle da
Somos Educação – dona do sistema de ensino
Anglo e de editoras como a
Ática e
Scipione, grandes produtoras de material didático. A compra, no valor de R$ 4,6 bilhões, ainda está sujeita à aprovação do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (
Cade), que regula a concorrência. É a segunda aquisição da
Kroton
– que controla grande parte do mercado privado de educação superior no
país, com 877 mil matrículas em um universo de 6 milhões de vagas – na
educação básica em menos de um mês.
A
Kroton já havia anunciado em abril a compra do
colégio Leonardo da Vinci, no
Espírito Santo. Segundo a empresa, com a aquisição da
Somos,
a fatia de sua receita que vem do ensino básico deve aumentar de 3%
para 28%, consolidando uma guinada em direção à educação básica.
Allan Kenji, doutorando do Programa de
Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (
UFSC) que estuda a atuação dos grupos empresariais na educação e sua vinculação com o
capital financeiro, explica os fatores que determinaram essa mudança de prioridade da
Kroton
e fala sobre como esse movimento está relacionado às alterações na
educação básica no Brasil, com a reforma do ensino médio e a
Base Nacional Comum Curricular (
BNCC) e também com o processo de
financeirização do capital na educação.
Allan Kenji concedeu entrevista à
André Antunes do portal
EPSJV/Fiocruz, 27-04-2018.
Eis a entrevista.
O que a compra da Somos Educação pela Kroton representa no
sentido da ampliação do interesse das grandes empresas de educação, hoje
predominantes na educação superior, na educação básica?
Na minha pesquisa tenho mapeado os grupos que têm
capital aberto e identificado o comportamento dos
fundos de investimento, e também as fusões e aquisições que aconteceram no
setor da educação. Em 2007 todos os grupos educacionais começaram a abrir ações na
Bolsa de Valores
e a captação se intensifica muito. O período que vai de 2008 a 2013 é o
ápice desse processo. É quando acontece o grosso das aquisições na
educação superior, até a
Kroton assumir sua forma atual
com 126 instituições de educação superior que, juntas, oferecem algo em
torno de 870 mil matrículas. Isso sem contar as instituições de
educação básica.
A partir de 2013 a gente viu esse movimento diminuindo. Isso tem a ver
um pouco com a crise claro, mas também com o limite das barreiras
competitivas entre os próprios grupos.
Quando a gente pega os 10 maiores grupos da
educação superior
hoje, eles têm juntos mais de 40% de todas as matrículas. E esse grau
de concentração começa a esbarrar em certos limites. O impedimento da
fusão entre
Kroton e
Estácio em junho de 2017 pelo
Cade [
Conselho Administrativo de Defesa Econômica] direcionou a
Kroton para a
educação básica. Tanto é que o principal executivo da empresa,
Rodrigo Gallindo, admitiu no contexto da recusa do
Cade
que, de fato, a educação superior no Brasil estava saturada, e a Kroton
deveria se voltar para a compra de empresas da educação básica.
Por outro lado, é um cenário de redução do
fundo público. O Estado encontra limites para transferir recursos do fundo público para o capital. Tanto é que o
Fies [
Fundo de Financiamento Estudantil] teve que ser reestruturado novamente.
Como essas mudanças no Fies impactam essa dinâmica de mercado?
Em 2017 já tinha sido totalmente reformulado e em 2018 passou por mais mudanças para torná-lo mais restritivo. A
inadimplência do
Fies
é bastante elevada, e aí o governo começou a restringir a porcentagem
de novos contratos que as empresas poderiam fazer. Isso começou no
governo
Dilma, com o aumento da taxa de juros do
Fies. No período de maior crescimento do
Fies,
entre 2011 e 2014, a taxa de juros chegou a 3,4%, que é praticamente
juros negativos, já que a inflação era muito superior. O ápice foi em
2014, com 731 mil novos contratos. De 2014 para o ano seguinte já cai
pela metade - 315 mil contratos - porque a taxa de juros vai para 6,5%.
Então por um lado a taxa de juros do
Fies subiu
e, por outro lado, o governo começou a restringir as possibilidades de
adesão, tanto dos estudantes quanto das instituições de educação
superior, para manter a taxa de novos contratos mais baixa. Isso
significa um
endividamento brutal da juventude. Inclusive uma das políticas do governo
Temer que é talvez das mais dramáticas é a proposição de vinculação do desconto em folha para o pagamento do
Fies.
Antes havia um período de carência, que permitia que, em tese, o
estudante entrasse no mercado de trabalho para, depois, começar a pagar o
empréstimo. O governo
Temer reduziu para zero: se
formou, começa a pagar. E até 30% do salário poderia ser automaticamente
retido. Agora em 2018 isso entrou em vigor - e é dramático.
O que essa compra significa para a Kroton e sua inserção nesse mercado?
Hoje, na
Bolsa de Valores, têm seis grupos que prestam serviços educacionais, pelo menos. Quatro deles são de educação superior:
Kroton,
Ser Educacional,
Ânima e
Estácio de Sá. Dois são exclusivamente sistemas de ensino e editoras, que é
Bahema e o
Somos. O que a
Kroton fez foi adquirir todas essas ações da
Somos, que é a majoritária da
Tarpon, que é um fundo de investimento, o mesmo que controla a
BR Foods.
A
Kroton já era gigante. Ela tem o dobro do tamanho de qualquer outro grupo. Em termos de ativos financeiros, a
Kroton é o
maior grupo educacional do mundo. Na
educação superior são 877 mil matrículas, mas esse dado é de 2016. Praticamente o dobro da
Estácio de Sá, por exemplo, que tem 436,3 mil. A terceira é a
Unip, que tem 403 mil matrículas, num universo de 6 milhões de matrículas no setor privado.
O que esperar da Kroton na educação básica?
A
Kroton sempre atuou na
educação básica. Ela é o antigo grupo
Pitágoras, fundado em 1966. O que a gente está vendo agora é uma mudança de estratégia da
Kroton. A minha hipótese, pelo que eu tenho visto dos relatórios para os acionistas, é de assumir o chamado
mercado premium,
que são as escolas de renome cujo público-alvo são as frações mais
altas da classe trabalhadora ou a burguesia com mensalidades de R$ 2 a 3
mil por mês, e controlar o mercado de editoras e sistemas de ensino.
Na
educação básica a forma de operação dessas instituições vai ser muito diferente do que foi na
educação superior, onde esses grupos controladores procuraram ofertar diretamente as matrículas. Vamos olhar para a
Somos Educação, o grosso dela são editoras:
Ática,
Scipione,
Saraiva,
Atual,
Saraiva Universitária,
Saraiva Jurídica. E o grosso do
Somos é o mercado editorial. E ele não é o único que a
Kroton tem pensado em comprar. O
grupo Santillana, por exemplo, que ela está negociando nesse momento, também envolve operações com editoras. São editoras e sistemas de ensino.
Quando a gente olha para a
educação superior, 75% das matrículas são
privadas. Na educação básica, dos 44 milhões de estudantes, 82% estão nas
instituições públicas.
A minha hipótese é a de que esses grupos controladores vão adquirir os
sistemas de editoras e os sistemas de ensino, porque o foco deles é o
fundo público, seu mercado são as
escolas de educação básica públicas.
A editora
Ática e a
Scipione são duas gigantes de material escolar. O maior mercado comprador de material didático são as
escolas públicas. Mas ele também tem o
Ph, o
Sigma,
que são sistemas de ensino. São todos sistemas de ensino que vendem a
preparação das aulas, os conteúdos, o planejamento, o currículo.
Atualmente já há entrada [desses produtos] nas escolas públicas. O
Instituto Ayrton Senna trabalha
muito com isso, principalmente no Rio de Janeiro tem muita discussão
sobre os sistemas de ensino, que aparece nas discussões de sistemas
apostilados.
Há chance de que a fusão seja vetada pelo Cade, como a compra da Estácio pela Kroton?
Não, porque no caso da
educação básica as escolas ainda são muito descentralizadas, são instituições ainda tipicamente familiares, relativamente pequenas. A
Kroton não vai passar ainda a ser um grupo com uma presença gigante na educação básica, até por essa escolha de ir para as
escolas premium,
mas o estratégico mesmo eu penso que são as editoras. Porque eu acho
que deve ser adotado esse modelo mais próximo das escolas charter dos
Estados Unidos, em que a estrutura e o
financiamento
continuam públicos, mas a administração da escola, o sistema de ensino e
os materiais utilizados são privados. E a participação do Estado é
transferir diretamente recursos para o capital.
Quais devem ser as repercussões da entrada desse grande capital para a educação básica?
Isso certamente muda o sentido estratégico da
educação básica. Nesse sentido acho que se coaduna muito com a
reforma do ensino médio e a
BNCC.
Quando a gente olha o que o capital tem demandado da escola fica claro
como esses projetos estão articulados, embora pareçam isolados. A
Confederação Nacional da Indústria [
CNI] em 2010 lançou um documento dizendo o que ela queria da formação da
força de trabalho no Brasil:
que os estudantes soubessem ler e escrever, que fizessem as quatro
operações matemáticas básicas e que compreendessem a lógica formal
simples, ou seja, entendessem que uma coisa tem uma causa e um efeito. E
que isto deveria ser o centro de todos os projetos de reforma que
deveriam ser encadeados pelo governo a partir dali.
A
reforma do ensino médio era uma demanda estratégica para esses grupos controladores da
educação superior. A preocupação deles durante toda a década foi o travamento de matrículas de desistentes no
ensino médio.
Porque se você não consegue habilitar os estudantes no ensino médio,
eles não têm diploma para continuar a educação no âmbito superior. Então
era um fluxo de mercado para eles. E eles demandavam que o ensino médio
aprovasse de forma automática, que fosse flexibilizado, que fosse
destituído de um sentido próprio e servisse mesmo como um meio de
trânsito entre o fundamental e a compra de vagas nas instituições
superiores privadas.
A
BNCC vem
completar e, de fato, instituir que a dimensão do conhecimento já não é
mais um requisito escolar. Daí, se entende a substituição do
conhecimento pelas competências, o que talvez seja um dos traços mais
duros da
BNCC. Minha hipótese é que ela flexibiliza o
suficiente para que se consiga ofertar para diferentes escolas e para
diferentes frações de classe diferentes tipos educativos. Você pode ter
essa
escola premium para formar as frações que vão dirigir empresas e negócios, e ter para diferentes tipos de
escola pública
um direcionamento das habilidades das competências. Para nós, isso
significa a possibilidade de eles ofertarem diferentes tipos de
sistemas de ensino, conteúdos e materiais didáticos para diferentes frações de classe.
Como os fundos de investimento têm participado desse processo
e quais os efeitos da ampliação da participação desses fundos na
educação brasileira como um todo?
Na
Kroton temos alguns fundos de investimento que chamam mais atenção: o
JP Morgan,
Invesco,
Coronation,
Capital World e o
Black Rock. Agora, esses são só alguns. A
Kroton
sozinha tem 1.758 investidores institucionais hoje. Um investidor
institucional é um fundo de investimento, um fundo de pensão, uma
seguradora, um banco que compra e vende na Bolsa de Valores os ativos da
companhia. Só um desses fundos, o
Black Rock, tem ativos da
Kroton,
é um dos maiores investidores dela, mas também tem ativos em 308
empresas ao redor do mundo. Então você tem situações como essa da
Tarpon, que era dona da
Somos, mas também é dona de uma parcela da
BR Foods.
Então quando a gente olha hoje para o ensino superior e olha para a
estrutura dos fundos já não dá mais para pensar a educação de maneira
isolada porque ela é um negócio entre outros tantos.
E porque esse dado é importante?
Porque em termos de
educação pública eu penso que nunca experimentamos um inimigo com uma
força social
tão concentrada como esse. Uma coisa era a gente enfrentar donos de
instituição privadas associados por meio de suas entidades federativas
brigando contra a
educação pública. Outra coisa é você pegar uma instituição que domina 300 multinacionais. E que tem a capacidade de determinar o ritmo da
economia.
Ainda por cima, o que eu tenho identificado na minha pesquisa, é que
esses fundos sequer são donos de só uma instituição. O [fundo de
investimento]
Oppenheimer era dono ao mesmo tempo da
Estácio e da
Kroton. O
Black Rock era dono da
Estácio, da
Laureate e da
Kroton.
O que a gente está vendo é que a educação é secundária em relação à
valorização do próprio fundo. Se é educação ou se você está vendendo
cerveja, tanto faz, porque o serviço em si não é sequer de conhecimento
dos gestores dos fundos. Não interessa para eles qual é o serviço que
está sendo ofertado. E, no entanto, são
forças sociais concentradas com tamanha inserção em outros setores da
economia brasileira
que têm a capacidade de impor as políticas no âmbito do Estado. É o que
a gente chama de se fazer Estado. Por isso eles podem fazer as próprias
leis, alterar as regulações.
Como o Estado vem operando para favorecer a formação dos grandes grupos?
Há mudanças ao longo de todo o período desde o governo
Itamar Franco
até hoje na educação superior que vai tornando-a mais flexível no
sentido do que se compreende como universidade, a pesquisa vai se
distanciando do ensino. Isso quer dizer que a
universidade vai deixando de ser o modelo predominante. Quando a gente olha os dados da
educação superior, o grosso dela está baseado nas faculdades e centros de ensino. A ideia de universidade é algo conservado em algumas
universidades públicas estaduais e federais. Quando a gente olha o que está sendo produzido em termos de pesquisa hoje no
Brasil
e o que está sendo ofertado em termos de ensino a gente vê que são dois
movimentos casados. Mas isso só pode ser feito porque esses capitais
tiveram capacidade de, no âmbito do Estado, se fazer Estado. Ou seja:
definir as leis de operação de mercado, do que é possível o que não é.
Além das alterações na forma de Estado e na própria legislação, a
LDB principalmente, tem outras alterações no
mercado financeiro que são imprescindíveis para o tipo de acumulação que foi feita por grupos controladores. Esses grupos, por exemplo, são
isentos de impostos sobre renda porque conseguiram alterações na legislação de fundos com as
leis de inovação tecnológica. Hoje, no
Brasil, estão isentas as operações que são consideradas
investimentos em ciência e tecnologia. Todos esses investimentos 'grossos' de fundos na
educação superior privada
são isentos de tributação sobre renda. Quer dizer, essa mudança na
legislação foi imprescindível e quem articulou isso foram os próprios
grupos, junto ao governo.
Isso se deu principalmente no governo
Lula. Talvez essa seja a lição mais dura para nós. No governo
Lula, esses capitais fizeram a própria legislação através da
Andima [
Associação Nacional das Instituições do Mercado Financeiro], e eles próprios emitiram a documentação sobre a regulação da operação dos fundos.
Isso tem a ver com o projeto desenvolvimentista, das campeãs nacionais?
Exatamente. Quem articulou esse movimento de
financeirização como chamamos foi a
construção civil, o
agronegócio. E todos os setores experimentaram isso no ciclo de crescimento do governo
Lula.
Entre meados de 2006 até 2011 tem um ciclo de crescimento que permitiu
que uma quantidade gigantesca de capitais se acumulasse na forma
monetária. E esses capitais foram encontrando formas de se investir.
Agora, os
fundos de investimento hoje no Brasil são predominantemente estrangeiros. Quer dizer, é
capital estrangeiro que vem no Brasil participar da
acumulação capitalista, sai daqui sem nenhuma
tributação sobre renda, e ainda recebe outros tipos de isenção ou
benefícios tributários ofertando matrículas, como no caso do
Prouni e do
Fies.
Além do
Prouni e do
Fies, o mais chamativo programa atende pelo nome de
Proies [
Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento das Instituições de Ensino Superior]. Ele permite a uma instituição converter até 90% de suas dívidas em emissões de títulos do
Tesouro. Ou seja, emitir dívida pública. Desde que elas convertam isso em matrículas no
ProUni. Os autores que analisam o
ProUni têm identificado que são as matrículas de pior qualidade. As
universidades têm autonomia para definir quais são as vagas que elas ofertam pelo
Prouni,
então a gente imagina que um estudante está cursando medicina,
engenharia... Não é assim. São cursos sequenciais, de curta duração, de
dois a três anos, normalmente de habilitação tecnológica. Parte dessas
matrículas é feita a distância, com material muito fragmentário.
Como movimento de avanço do capital financeirizado hoje
expresso na expansão da Kroton sobre a educação básica se articula com
as formulações de organizações multilaterais, como a OCDE e Banco
Mundial, que recentemente lançou um relatório com recomendações para a
educação e para a saúde?
O
Banco Mundial, por exemplo, é composto por vários braços. Um desses é o que a gente chama de
IFC [
Corporação Financeira Internacional],
que funciona oferecendo crédito. Ele foi primordial para a expansão da
educação superior nesses moldes no Brasil. Só nesses grupos, ele fez
cinco operações estratégicas: três para a
Estácio, uma para o grupo
Laureate e uma para o grupo
Ser Educacional,
envolvendo valores de até US$ 150 milhões. Tudo para poder aumentar o
grau de concentração a partir da compra e venda de instituições. Não é
só fornecendo o aparato ideológico e que fundamenta esses projetos sobre
a gestão pública, sobre a reforma do Estado, como a gente vê nesse
documento ‘
Um Ajuste Justo’ que o
Banco Mundial
lançou pra apoiar o ajuste fiscal. Além disso, há o braço financeiro
dessas organizações multilaterais atuando. E não é à toa, mais de 90%
desses fundos de investimento são de capitais estrangeiros e são os
fundos que participaram da crise econômica nos Estados Unidos em 2008. O
interesse dessas instituições multilaterais está casado com o fato de
que se trata de capitais internacionais se valorizando no Brasil. O
mesmo processo que tem acontecido com portos, aeroportos, estaleiros.
Isso tem consequências para a educação como um todo...
O que a gente tem visto é um aprofundamento do lugar do Brasil na
divisão internacional do trabalho.
Eles conseguem pegar a gente por um lado pela oferta desse ensino,
nesses moldes, uma educação fragmentária, rarefeita, em que a dimensão
do conhecimento já não faz mais parte de nenhum processo de
escolarização,
é substituído por outras concepções, como competências, habilidades
socioemocionais; e por outro lado nos pegam pela produção científica. A
Capes contratou uma subsidiária da
Pearson, a maior editora científica do mundo, dona da
Wizard,
dona de várias instituições, para fazer um levantamento da situação da
pesquisa hoje no Brasil. E eles identificaram que nenhuma pesquisa é
produzida nessas instituições privadas. O grosso da pesquisa hoje no
Brasil acontece em
instituições públicas. E das 20 maiores companhias com interesse na produção científica brasileira, só uma é brasileira, que é a
Petrobras. Tirando a
Petrobras,
15 instituições são farmacêuticas ou bioquímicas. O que demonstra como o
lugar do Brasil hoje na ciência mundial é o de pegar a nossa fauna e a
nossa flora, catalogá-las, e enviar para os centros de pesquisa
internacionais utilizem esses conhecimentos para produção de
medicamentos. Que nós compramos de volta pelo
SUS. Então a gente tem a
Bayer, a
Novartis, a
Pfizer, a
Roche,
Johnson & Johnson. Por um lado acho que a gente tem visto um ajuste da produção das
universidades públicas
que produzem pesquisa, se readequando para as parcerias
público-privadas, para uma relação cada vez mais estreita com esse tipo
de
produção científica e tecnológica
e, por outro lado, um braço articulado com o ensino que é a formação
para a juventude que é essa no modelo que a gente tem visto nesses
grandes grupos.
E agora se voltando para a formação básica.
Exatamente. Os dois ajustam a formação da
força de trabalho com o tipo de lugar que a gente tem na
produção científica mundial. É o desenvolvimento do subdesenvolvimento. Chega a casos grotescos: o braço de agrotóxicos da
Bayer é um dos mais relacionados com as
universidades brasileiras, e o outro é o braço que vende quimioterápicos. Eles envenenam e depois vendem o quimioterápico. Não seria possível isso sem
SUS, sem
educação básica pública. Por isso que essas formas de articulação entre o
fundo público e os interesses desses grandes capitais é fundamental.
Mas o eixo é a questão da dependência. A nossa tendência seria pensar que eles estão destruindo a
educação. Não estão. Estão adequando a educação ao tipo de lugar que foi determinado para o Brasil no mundo. O que a
CNI
está demandando em termos educacionais hoje pra formação da força de
trabalho? Saber ler e escrever e saber que se eu solto um objeto ele cai
no chão. O tipo de
educação básica que eles estão
dispostos a ofertar, seja na educação básica ou superior, e na infantil
também, é perfeitamente alinhada a um projeto de país subordinado.
Quando a gente olha a questão da dependência a gente vê que não são
erros, não são pontos fora da curva; é um eixo articulador que ao longo
desses governos foi se aprofundando e, agora sob o governo
Temer, ganhou muito mais intensidade.
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/578444-kroton-educacional-em-termos-de-educacao-publica-nunca-experimentamos-um-inimigo-com-uma-forca-social-tao-concentrada-como-esse